Nota da edição: pela sua dimensão, o presente estudo é apresentado em dois capítulos. No primeiro é feita a apresentação do Programa SAAL no Algarve. No segundo é tratada, inclusive no contexto actual, a intervenção SAAL no sítio do Apeadeiro em Meia Praia, celebrizada pela denominação de «Índios da Meia Praia»

 

 

O SAAL no Algarve e os Índios da Meia Praia (2)

 

 

O SAAL FRUTO DE ABRIL

 

Com a Revolução de 25 de Abril de 1974, foram reconhecidos, aos portugueses, direitos que, até então, lhes tinham sido negados. Entre eles, o direito à habitação e à participação na sua concretização.

Em 6 de Agosto de 1974 foi publicado, no Diário do Governo I série-n.º 182, o Despacho do Ministério da Administração Interna, MAI e do Ministério do Equipamento Social e Ambiente (MESA). Despacho este que instituiu o Serviço de Apoio Ambulatório Local (SAAL) no âmbito do Fundo de Fomento da Habitação (FFH).

O Despacho referia que este Serviço se destinava, expressamente, a « (…) apoiar, através das Câmaras Municipais, as iniciativas de populações mal alojadas no sentido de colaborarem na transformação dos próprios bairros(…)» e também «(…) devem os trabalhos de infraestrutura viária e sanitária, que constituem a base essencial das operações ser custeados pela autarquia local, bem como a disponibilidade de terrenos para a urbanização (…)».

Igualmente se esclarecia, «Recorde-se que a principal justificação desta política está na apropriação de locais valiosos pelas camadas populares neles radicadas sob forma marginal». Determinava ainda que, «(…) o FFH, através do SAAL, estabelecerá os acordos necessários com as Câmaras que o solicitem para o fornecimento dos projectistas, monitores e fiscais técnicos exigidos pelas operações.»

Com o apoio de equipas técnicas SAAL que se criaram para este efeito, contratadas pelo FFH, organizaram-se associações de moradores por todo o País. Elaboraram e aprovaram os respectivos estatutos e legalizaram-se por escrituras públicas, com publicação em Diário da República.

Foi assim dado início aos projectos e às obras de construção de milhares de habitações em centenas de bairros. Cumpria-se um dos principais objectivos com que o 25 de Abril respondia à democratização da sociedade portuguesa, respondendo a um dos maiores problemas nacionais – a carência de habitação.

 

O SAAL NO ALGARVE

No Algarve, em resposta às necessidades e solicitações de moradores, constituíram-se equipas técnicas SAAL em Lagos, Loulé, Olhão e Tavira. Estas equipas trabalharam para as 21 associações de moradores do Algarve, então criadas desde Aljezur a Vila Real de Santo António.

Segue-se uma breve memória da constituição dessas equipas, bem como dos projectos a que estiveram ligadas.

 

 

EQUIPA DE LAGOS

A equipa técnica era constituída por José Veloso, arquitecto, José Brito Costa, engenheiro, Pedro Vieira, engenheiro, Luis Abreu, arquitecto, David Oliveira, engenheiro técnico, José Rijo, arquitecto estagiário, Saldanha da Gama, topógrafo, Artur Sequeira, desenhador, José Gonçalves, desenhador, João Costa, desenhador, Carlos Grade, desenhador, Carlos Torpes, desenhador, António Oliveira, desenhador.

A equipa administrativa e de serviço social integrava Dulce Costa, Zélia Correia, Luís Rosado, Luísa Veloso e Leonarda Guerreiro.

Foi esta equipa responsável pelo apoio às Associações de Moradores apoiadas, a seguir indicadas:

  • Em Aljezur, a Associação de Moradores O Povo Vencerá, com a construção de 20 fogos;
  • Em Vila do Bispo, no Burgau, a Associação de Moradores Unidade, com a construção de 17 fogos;
  • Em Lagos, na Luz, a Associação de Moradores 11 de Março, 16 fogos; em Espiche, a Associação de Moradores Liberdade, 31 fogos; em Bensafrim, a Associação de Moradores Zona Verde, 21 fogos; a Associação de Moradores 28 de Setembro, 108 fogos; e, na Duna, a Associação de Moradores 1º. de Maio, 18 fogos;
  • Em Portimão, no Alvor, Associação de Moradores Bairro Popular, 48 fogos; a Associação de Moradores Progresso, 75 fogos; a Associação de Moradores Um de Junho, 24 fogos; e, a Associação de Moradores Boa Hora 54 fogos.
  • Na Lagoa, na Mexilhoeira da Carregação, a Associação de Moradores Boa Vontade, 70 fogos; e, em Estombar, a Associação de Moradores Boa Esperança, 60 fogos.
  • Em Silves, a Associação de Moradores Progresso, 52 fogos; e, em Enxerim, a Associação de Moradores Bairro Vermelho, 34 fogos.

 

SAAL Lagos

 SAAL - Lagos

 

 

EQUIPA DE LOULÉ

A equipa técnica era constituída por José Lopes da Costa, arquitecto, Manuel Dias, designer projectista, José Manuel Brito, engenheiro, Leonel Fadigas, arquitecto paisagista, Francisco Soares, orçamentista medidor, Afonso Pais, engenheiro, Henrique Mendonça, desenhador, Joaquim Loureiro, desenhador, José Sequeira, desenhador, João Leonor, desenhador.

A equipa administrativa integrava Maria da Conceição Ávila, Maria Benilde Barreiro, Glória Santana.

 

Foi esta equipa responsável pelo apoio às Associações de Moradores a seguir indicadas:

  • Em Albufeira, na localidade de Ferreiras, a Associação de Moradores 17 de Junho, 60 fogos.
  • Em Loulé, na Quarteira, Associação de Moradores local, 150 fogos.
  • Em Olhão, a Associação de Moradores 11 de Março, 40 fogos.

 

 

EQUIPA DE TAVIRA

 A equipa técnica era constituída por João Moitinho, arquitecto, João Brito, engenheiro, José António Menezes, engenheiro, António Chaves Ramos, engenheiro, Mateus Cruz Azevedo, engenheiro, Leonel Fadigas, arquitecto, José Carlos Carvalho, arquitecto estagiário, Artur Sequeira, desenhador , Ho Kai Hi, desenhador, Álvaro Soares da Torre.

A equipa administrativa integrava Rita Vilela Bastos, Ana Ferrão Lopes, José António Gravata Rodrigues, António Luís Saraiva.

 Foi esta equipa responsável pelo apoio às Associações de Moradores a seguir indicadas:

  • Em Tavira, a Associação de Moradores 1º. de Maio, 62 fogos; e, na localidade de Cabanas, a Amigos Unidos de Cabanas, 24 fogos.
  • Em Vila Real de Sto. António, a Associação de Moradores 28 de Junho, 80 fogos; e, em Monte Gordo, a Associação de Moradores Povo Unido Monte Gordo, 133 fogos.

 

SAALTavirageral

 SAAL - Tavira

 

 

PROJECTOS NÃO CONCRETIZADOS

 

Ficaram por concretizar os seguintes projetos:

  • Em Monchique, da Associação de Moradores Um de Maio, 64 fogos;
  • Em Loulé, na localidade de Alte, da Associação de Moradores 1º. de Maio, 32 fogos;
  • Em Olhão, da Associação de Moradores 18 de Maio, 50 fogos.

 

 

UM SALDO ALTAMENTE POSITIVO

Em resumo, o projecto SAAL no Algarve respondeu às necessidades de habitação, colocadas por 27 Associações de Moradores e conduziu à construção de 1238 fogos.

Esta dinâmica e os resultados obtidos com a implantação do SAAL no Algarve, resultaram directamente do princípio, que foi adoptado pelas populações e pelas equipas técnicas, com a adesão e o apoio das Comissões Administrativas das Câmaras Municipais, de que o SAAL não era apenas um programa do Governo para eliminar barracas e casas degradadas e construir habitações. Foi entendido que o SAAL era mais do que isso, era a prática de um direito democrático que cidadãos, até então marginalizados e distantes da participação na gestão da coisa pública, passavam a possuir. Era o direito a construir uma habitação condigna e o direito a participar nas decisões sobre a sua casa e a presença do seu bairro na sua cidade.

O aparecimento no Algarve deste número de Associações de Moradores abrangendo praticamente toda a região, foi o resultado das grandes mudanças trazidas pelo 25 de Abril e das novas políticas então postas em prática, resultando em mobilização das populações para participação activa e organizada, neste caso formando as Associações de Moradores do programa SAAL instituído pelo Governo.

Com o apoio activo das Comissões Administrativas das Câmaras Municipais dos Concelhos onde se desenvolveu o SAAL e das equipas contratadas pelo FFH, as populações mal alojadas abrangidas pelas condições do programa SAAL organizaram-se na criação das associações de moradores, debateram, aprovaram e escrituraram os seus estatutos, decidiram na escolha dos terrenos e participaram nos programas e nas soluções dos projectos para as habitações.

Uma vez obtidas as aprovações dos projectos e a concessão dos apoios financeiros do Governo, as Associações assumiram a construção das habitações, preferindo sempre o regime de administração directa e participando com o seu esforço pessoal e os recursos próprios de que conseguiam dispor.

O impacto do SAAL no Algarve não se verificou apenas no direito à habitação e nos aspectos sociais e culturais. Reflectiu-se igualmente na economia local, nomeadamente participando na sobrevivência de empresas comerciais e industriais do ramo da construção civil e do mobiliário e equipamento doméstico, que sofriam os efeitos da crise instalada no sector.

 

José Manuel Freire

José Veloso