Nos últimos anos, tem vindo a tornar-se unânime em Portugal que o mar deve ser uma prioridade nacional. Para isso muito tem contribuído o debate político e os diversos estudos económicos que vêm permitindo sustentar cada vez mais esta ideia. A aposta do município de Peniche no mar está aliás bem explícita na estratégia de desenvolvimento do concelho (a “Magna Carta – Peniche 2025”), documento objeto de largo envolvimento e participação da população.
De facto, o mar pode constituir-se como uma oportunidade e uma causa tão importante para Portugal quanto são atualmente a educação e a qualificação dos portugueses, o aumento da produtividade e da competitividade da economia, o aumento do emprego ou a credibilização do sistema de justiça. Devemos por isso concentrar esforços nesta nova causa: tirar pleno partido do mar, enquanto recurso natural, base de expansão da nossa atividade económica e oportunidade para crescimento do nosso Produto Interno Bruto (PIB).
É importante abraçarmos novas causas, particularmente em momentos de crise como os que se vivem atualmente. É vital desenvolvermos novas ideias de negócio, com vista a construir novas indústrias e serviços. O mar deve ser uma dessas ideias, capaz de gerar atividades inovadoras, fazer surgir novas oportunidades e criar os tão necessários postos de trabalho.
Ainda assim, considero fundamental gerir esta nova aposta com cautela e parcimónia, respeitando os direitos de todos, sobretudo das atividades que historicamente são desenvolvidas no mar, como a pesca, e protegendo a fauna e a flora com estatuto de proteção.
A sustentabilidade da exploração dos recursos marinhos é um desafio que tem de ser posto em prática, sob pena de matarmos a galinha dos ovos de ouro. Acredito que será possível conciliar atividades como a pesca, a aquacultura, a exploração de minérios e de hidrocarbonetos no subsolo marinho, os portos e os transportes, a captação de energia das ondas e de eólicas offshore, os desportos, o turismo e o lazer e, ainda assim, garantir a sustentabilidade ambiental do nosso mar. Não podemos continuar a desperdiçar um dos principais recursos naturais do nosso país.
Este tempo de crise profunda que vivemos atualmente é a oportunidade ideal para investirmos a sério no mar e inovarmos enquanto país. São muitas as razões que sustentam esta aposta no mar: Portugal apresenta uma localização privilegiada sobre o Oceano Atlântico, constituindo-se como uma plataforma giratória entre continentes, no centro de importantes rotas do comércio internacional e do transporte marítimo; possui ainda a maior Zona Económica Exclusiva da União Europeia e está em vias de ver reconhecida como sua, uma das maiores plataformas continentais do mundo.
Portugal goza ainda de uma ligação histórica e afetiva ao mar que é reconhecida além-fronteiras. Este reconhecimento generalizado de um passado glorioso poderá funcionar em claro benefício dos produtos e dos serviços marítimos portugueses. Portugal conta com suficientes estudos e planos e até legislação, como são os casos do Relatório da Comissão Estratégica dos Oceanos, do Estudo do Hipercluster do Mar, do Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo ou do Regime Jurídico do Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo Nacional. O mar e as suas atividades encontram-se claramente subaproveitados. Portugal é atualmente um dos países da Europa ocidental que menos empregos e riqueza consegue gerar a partir do mar. Também por isso, o nosso potencial de crescimento é maior. Poderemos aprender com as melhores práticas internacionais, sobretudo o que vêm fazendo os países marítimos do norte da Europa.
A aposta na economia do mar pode contribuir decisivamente para acabar com a ideia de um Portugal periférico, transformando-nos num país central, na rota da logística de transporte mundial, e que sabe aproveitar essa localização. Como já tive oportundade de referir, algumas atividades tradicionais do mar continuarão a ser essenciais à sua exploração. Os portos e os transportes constituem dois sectores que estão fortemente interligados e que são imprescindíveis no aproveitamento do potencial dos oceanos. Sem uma aposta reforçada nesses sectores, Portugal não poderá vir afirmar-se como um país marítimo.
No domínio da energia, sector de importância estratégica para qualquer país, convém não esquecer que a exploração de petróleo, da energia das ondas e da energia eólica offshore podem, a médio prazo, garantir a independência energética de Portugal. Atualmente, 40% do petróleo e 60% do gás natural consumidos na Europa já são retirados do mar e a quantidade de energia renovável produzida com recurso a novas tecnologias não pára de crescer.
Num contexto europeu onde os temas da energia e do clima estão cada vez mais na ordem do dia e fazem parte dos objetivos acordados para 2020, importa ter presente que Portugal dispõe dos maiores espaços marítimos e de recursos como o vento e as ondas, dos quais deverá tirar partido. Um dois maiores potenciais do mar português está, sem dúvida, na produção de energias renováveis no mar ou a partir desta.
Neste domínio, importa destacar o apoio e empenho que o município de Peniche tem dispensado, desde 2007, ao desenvolvimento da tecnologia WaveRoller, desenvolvida pela empresa finlandesa AW-Energy e que, até 2019, terá condições para passar de uma única máquina com características de protótipo, já instalada ao largo da praia da Almagreira, para um verdadeiro parque de energia das ondas, com equipamentos de versão comercial a criar no mesmo local.
A pesca sustentável e a aquacultura têm também que se assumir como atividades a expandir. As quantidades de pescado capturado ou produzido em Portugal não se coadunam com os consumos per capita registados no nosso país. É fundamental aumentar a produção e, com as condições que o país apresenta, reduzir as importações e aumentar as exportações.
A pesca da sardinha, pela sua ancestral importância económica e social, pela sua forte distribuição ao longo de toda a costa continental, pelas indústrias relevantes que lhe estão diretamente relacionadas, assume particular relevância e deve estar na primeira linha de defesa da sua continuidade, garantindo não só a sustentabilidade do recurso mas também as condições de funcionamento da frota de cerco e a defesa dos seus pescadores.
A contínua ligação da administração central e local às populações, aos sindicatos e às organizações representativas das profissões do mar reveste-se de primordial importância como forma de auscultar as suas necessidades e anseios. Na área do turismo náutico e de recreio, e do turismo de cruzeiros muito existe ainda por fazer. Com efeito, a náutica de recreio apresenta potencialidades e um potencial de crescimento que é necessário aproveitar com a construção e/ou requalificação de portos de recreio.
Portugal conta com cerca de cinco lugares de amarração por quilómetro de costa quando, por exemplo, a Espanha tem 16 lugares de amarração por quilómetro, a Suécia 25 e a França 43. Ao largo de Portugal passam anualmente mais de 15 mil embarcações de recreio que não atracam nos nossos portos e vários estudos apontam para a necessidade de existência de um porto de recreio náutico, de 30 em 30 quilómetros, ao longo da costa atlântica do país.
Já o turismo de cruzeiro tem vindo a crescer exponencialmente na Europa e em Portugal, na última década. Importa continuar a desenvolver as infraestruturas portuárias, coordenando as tarefas de todos os agentes e entidades envolvidas nesta atividade, incluindo as autarquias das cidades portuárias, os seus hotéis e demais oferta turística.
É tempo de olharmos para o mar como uma oportunidade e uma aposta de futuro, capaz de criar mais riqueza e proporcionar mais desenvolvimento e qualidade de vida para os portugueses. Novembro é para nós, em Peniche, o mês dedicado ao mar, envolvendo toda a comunidade ligada ao setor da pesca e da própria Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar.
Jorge Amador
Vice-presidente da Câmara Municipal de Peniche