No início de Outubro, o município de Coimbra foi premiado com o prémio categoria Inovação da Revista Veterinária Atual. Reconheceu-se assim um conjunto de práticas inovadoras: Regime Aberto de Vigilância Descontínua com realização de abrigos descobertos e de gabinetes cat-friendly, a multiplicação das esterilizações pediátricas. De facto, uma nova política tem vindo a ser prosseguida no canil/gatil de Coimbra, desde que a CDU, em finais de 2013, assumiu também esta competência.

O homem do saco amedrontou gerações e gerações de crianças. O medo incutido às crianças alimenta mecanismos de sua auto-defesa. Coisas da sabedoria popular… As gerações mais antigas recordam-se da carroça da câmara ou do reboque-jaula que estacionava ao cimo da rua enquanto alguns homens fardados iniciavam uma caçada aos cães vadios. A pequenada rejubilava se algum cão não se deixava apanhar ou se fugia à captura. Bem podiam então os mais velhos tentar a lição da limpeza das ruas, o perigo das mordeduras, as doenças, etc. Para os putos, cão vadio era sinal de liberdade. Para os putos, cão ou gato vadio era companheiro.

Os tempos mudaram. Há muito mais quem se preocupe com o bem-estar dos animais de companhia, mas também com a saúde pública.

Em Coimbra, concelho de 150 mil habitantes, estima-se que possam existir mais de 35 mil cães com dono e cerca de 9 a 10 mil gatos de companhia. Há porém, anualmente cerca de 1500 animais que dão entrada no canil municipal e estima-se que outro tanto possa ser abandonado nas ruas.

A reprodução destes animais ocorre a um ritmo brutal. Em seis anos, uma gata e os seus descendentes poderão dar origem a 240 mil animais! Por cada ser humano nascem 15 cães e 45 gatos.

Aos serviços médico-veterinários municipais compete, de acordo com a lei em vigor, actuando dentro das suas atribuições nos domínios de defesa de saúde pública e do meio ambiente, proceder à captura dos cães e gatos vadios ou errantes e decidir, após exame clínico, o seu ulterior destino. Mas durante muito tempo, no imaginário dos munícipes, o canil era o lugar de recolha de animais abandonados que incomodavam moradores ou o trânsito, se tornavam perigosos para a segurança dos cidadãos ou para a saúde pública e que entrados no canil, e decorridos os prazos legais, seriam abatidos, embora este destino final, por incomodidade óbvia, não fosse particularmente propagandeado. Felizmente, a visão e a política das cidades é e pode ser outra. Os direitos dos animais e a importância dos animais de companhia para os cidadãos são outras também. Assim, procuramos reduzir as eutanásias aos mínimos que se impõem por obrigações legais e razões de saúde. Tal objectivo só é alcançável com uma redução do número de animais entrados, ou seja menor abandono, o que implica que os seus donos tenham meios financeiros para tratar dos seus animais e uma consciência necessária para possuírem animais de companhia e ainda, por outro lado, o aumento de adopções responsáveis de animais, recolhidos por famílias de acolhimento numa primeira fase e depois definitivas. O “canil” abre-se à comunidade. As políticas das cidades também se têm alterado relativamente a felinos.

Em várias cidades europeias dão-se os primeiros passos na adopção de programas CED - Captura, Esterilização e Devolução - de gatos errantes. Durante anos, recorreu-se à captura sistemática de gatos assilvestrados e consequente eutanásia, já que estes gatos não têm potencial de adopção, devido ao seu comportamento marcadamente selvagem. Mas essas práticas com custos elevados são no limite ineficazes. É impossível capturar todos os elementos das dezenas e dezenas de colónias que existem em cidades, mesmo com a dimensão de Coimbra. A reprodução extremamente rápida dos gatos não o permite. Assim, têm vindo a ser adoptadas novas políticas de captura para esterilização dos animais e sua devolução ao espaço da colónia. Tal trabalho, com a colaboração e a aceitação expressa de moradores e protectores, permite a redução gradual, mas irreversível, das colónias de gatos de rua, mantendo-os em níveis populacionais aceitáveis, sem prejudicarem as populações e servindo como bio-predadores para o controlo de pragas, nomeadamente de roedores, fenómeno este também de difícil extermínio, sobretudo nas zonas históricas e mais velhas das cidades.

Hoje, o Serviço Médico-Veterinário (SMV) de Coimbra promove a esterilização de animais para adopção, contribuindo para o equilíbrio das espécies. Com quase 500 esterilizações desde o início do ano até 30 de Setembro (381 felinos e 97 canídeos). Promove-se a política de abate zero de animais saudáveis. As adopções têm aumentado significativamente: 224 animais adoptados em 2013, 406 em 2014 e em 2015, até 30 de Setembro, 516 animais foram adoptados no canil de Coimbra, a que se somam 117 outros em colónias CED e em regime aberto (RAVD). O canil/gatil é hoje um local aberto. A página facebook permite a divulgação e promoção de adopções. Frequentemente visitado por crianças e idosos, o canil/gatil coopera com diferentes projectos escolares e outros.

A Revista Veterinária Atual premiou o SMV de Coimbra na categoria Inovação na Medicina de Canis. O prémio é um reconhecimento do caminho percorrido e lança novos desafios. Na Câmara Municipal de Coimbra, o vereador da CDU promove uma política de bem-estar animal e de saúde pública, contribuindo para a construção de uma cidade com mais qualidade de vida.

 

Francisco Queirós