A REABILITAÇÃO URBANA COMO VETOR ESTRATÉGICO DO MUNICÍPIO
Desde 1986 que o município de Almada encarou a reabilitação como um vetor estratégico das políticas municipais. Nesse ano foram aprovados por edital onze núcleos históricos tendo em vista a sua reabilitação e no ano seguinte teve lugar a criação do Gabinete dos Núcleos Históricos que iniciou um trabalho de levantamento, estudos e planos com esse objetivo.
Em 1988, com a entrada em vigor da legislação que permitiu a criação de programas de apoio à reabilitação, o município de Almada aderiu aos programas RECRIA e RECRIPH, iniciando-se assim um processo de reversão da degradação do parque habitacional privado.
Até hoje tem sido dada relevância primordial à reabilitação e regeneração urbana, com a aprovação de instrumentos de gestão territorial específicos e a adesão a programas que concorrem para esse objetivo, numa já natural gestão das oportunidades, das quais o município da Almada tem sabido tirar o maior proveito.
HISTÓRICO DA REABILITAÇÃO
Após a delimitação dos Núcleos Históricos e através do gabinete então constituído para o efeito, em 1988, o município de Almada aderiu aos programas RECRIA e RECRIPH, tendo sido um dos municípios que manteve o programa ativo até à sua suspensão em 2010.
Tendo sido à data um programa pioneiro e interessante, as limitações legais que impunha às respetivas candidaturas, deixava de fora um sem número de situações que limitavam de forma decisiva a intervenção do município.
No tempo de vigência dos programas RECRIA e RECRIPH, atentos às oportunidades disponíveis concorrentes para a reabilitação urbana, o município de Almada assegurou a aprovação de candidaturas aos fundos disponíveis de que são exemplo a Operação Integrada de Desenvolvimento da Península de Setúbal (OIDPS), o PRU "Parcerias para a Reabilitação Urbana" e o QREN "Politica de cidades - Parcerias para a Regeneração Urbana".
Nestes programas, ao mesmo tempo que se apoiavam os proprietários nos processos de reabilitação do edificado, executou-se uma quantidade assinalável de obras de reabilitação de edifícios transformando-os em equipamentos referência, bem como se procedeu à requalificação de espaços públicos nos diversos núcleos antigos, designadamente: a intervenção sistemática no parque habitacional em oito quarteirões em Almada; a Casa da Cerca; o Museu do Sítio; a reabilitação do Solar dos Zagalos; o Núcleo Empresarial de Almada Velha; o Quarteirão das Artes; o Museu de Interpretação de Almada Velha; o Núcleo Empresarial; o Museu da Música; a Requalificação de Espaços exteriores de Almada Velha; a Pedonalização da Rua Cândido dos Reis; entre outros.
Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.e 307/2009, a Câmara Municipal de Almada desenvolveu trabalho no sentido de encontrar todas as oportunidades que o novo enquadramento legislativo oferecia.
Foi entretanto elaborado todo um trabalho de recolha de informação e preparação logística e instrumental para adequar o novo quadro legislativo à realidade existente e à experiência adquirida em Almada.
Finalmente, cumpridos os requisitos legais aplicáveis, em 16 de Maio de 2011 é publicada a primeira Área de Reabilitação Urbana (ARU) no país, abrangendo o núcleo central de Cacilhas designadamente a sua artéria tradicionalmente mais relevante a Rua Cândido dos Reis.
Seguiram-se em 2012 as ARU's de Almada e Trafaria e em 2013 as do Pragal, do Monte de Caparica e Cova da Piedade.
CACILHAS PORTA DE ENTRADA DO CONCELHO - CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS
Perímetro da ARU de Cacilhas
A Rua Cândido dos Reis, área central da intervenção, caracterizava-se por uma rua de perfil tradicional, com pavimento rodoviário e passeios de pequena dimensão, onde se localizava um número significativo de estabelecimentos comerciais, predominantemente de restauração, cuja convivência com o espaço urbano resultava numa situação de constante conflito decorrente da enorme pressão de estacionamento ilegal e indevido e ao tráfego rodoviário que se verificava.
Por outro lado o peão era frequentemente obrigado a circular no espaço rodoviário dada a exiguidade dos passeios e à ocupação abusiva das viaturas.
O parque habitacional construído, muito embora tendo sido alvo de algumas intervenções no âmbito dos programas RECRIA e RECRIPH, encontrava-se degradado e as iniciativas no sentido da sua regeneração eram incipientes.
A centralidade do local e a sua posição geográfica privilegiada concorriam para uma pressão sobre a área que ultrapassava largamente a influência local e que em nada contribuía para incentivar as iniciativas no sentido da sua regeneração. Apesar desta conflitualidade latente existia uma evidente resistência à mudança sobretudo centrada nos estabelecimentos comerciais mas também nos residentes, demonstrando claros receios decorrentes do processo de transformação da rua, questionando fortemente a pedonalização que se adivinhava.
As questões ligadas à acessibilidade rodoviária foram desde o início do processo até à conclusão das obras um tema de evidente conflito.
Por um lado o receio dos comerciantes virem a perder os seus clientes por estes não poderem trazer os carros até à porta do estabelecimento, por outro dos moradores que passariam a viver numa rua pedonal pela forma como poderiam aceder aos edifícios onde moravam.
No entanto, podíamos observar que nem os visitantes nem os moradores que chegassem à rua tenham oportunidade de estacionar o seu veículo, face ao estacionamento constante ilegal e abusivo que se verificava. Pelas mesmas razões os estabelecimentos comercias, especialmente os de restauração e bebidas, estavam impedidos de usufruir da rua devido aos evidentes condicionalismos do espaço.
Na envolvente próxima da área de intervenção tinha já sido possível assegurar algumas intervenções: a remontagem do antigo farol de Cacilhas, em tempos deslocalizado para os Açores, e o fundeamento da Fragata D. Fernando II e Glória e mais recentemente do submarino Barracuda, estas duas últimas em estreita relação e colaboração com a Marinha Portuguesa conferindo a este local especial interesse e atratividade.
ESTRATÉGIAS DE ABORDAGEM
Na obra de pedonalização da Rua Cândido dos Reis
Atento às potenciais tensões e dificuldades que um processo de regeneração urbana encerra, o município começou por estabelecer uma estratégia de abordagem à obra de pedonalização da Rua Cândido dos Reis, a que se somariam outros potenciais conflitos gerados pela coexistência da obra de espaços exteriores com as obras privadas da ARU de Cacilhas que entretanto tinha sido publicada em Diário da República.
Anteriormente à obra de espaços exteriores o município transferiu o Centro de Turismo para o antigo quartel dos Bombeiros Voluntários e Cacilhas que entretanto tinha adquirido e reabilitado.
Foi a partir deste equipamento, situado na rua, que se passou a centrar o esforço de ligação do município com os moradores e comerciantes centrado na estratégia de abordagem da obra e da ARU de Cacilhas.
Estabeleceu-se um plano de comunicação periódico com todos os interessados centrado em duas vertentes: Entrega de comunicados quinzenais sobre o andamento e previsão de abertura de frentes das obras e o estabelecimento de assembleias periódicas com moradores e comerciantes com a presença de técnicos e eleitos.
Foi também destacada uma técnica que ficou residente no Centro de Turismo assegurando uma relação de proximidade com os utilizadores da rua com vista a acolher todas as reclamações e sugestões. Qualquer acontecimento relevante era imediatamente transmitido aos serviços responsáveis que se prontificavam, no imediato, em assegurar as respostas mais adequadas a cada situação.
Com vista a acautelar eventuais prejuízos decorrentes das obras, foi executada uma reportagem fotográfica ou filmada dos edifícios contíguos à área de intervenção. Tal medida tornou-se necessária atendendo ao fato de estarmos perante um casco histórico com edifícios cujas condições estruturais, nalguns casos, estavam longe de assegurar os parâmetros de segurança adequados.
Na ARU de Cacilhas
Trabalhar em reabilitação, na atual conjuntura, requer um exercício permanente de confiança, de determinação e persistência. É abordar os potenciais candidatos, numa altura em que se restringem os investimentos de todo o género, e convencê-los de que vale a pena investir na reabilitação ainda que estivesse até aí longe do seu horizonte investir as suas poupanças ou assumir encargos em obras de conservação.
No fundamental estabeleceram-se as metodologias de abordagem encaradas em diferentes frentes, resultando estas das experiências anteriores e das potencialidades do programa, atendendo ainda às estratégias de informação e mecanismos de auxílio aos potenciais candidatos, a saber:
Relação de proximidade
Considerou-se imprescindível, estabelecer no local um atendimento privilegiado de primeira linha, com o objetivo de atender a todas as pretensões, esclarecer dúvidas, apresentar o programa e fazer o atendimento técnico necessário. No caso concreto estabeleceu-se o "Balcão da Reabilitação" no Centro de Turismo.
Informação
A informação assume-se em duas dimensões que são determinantes para a operação: o conhecimento generalizado do programa e a informação sobre os aspetos específicos do mesmo.
No primeiro caso, foi feito um esforço importante de divulgação, quer através de informação escrita designadamente no Boletim Municipal quer através de contacto pessoal com os proprietários. Considerou-se também importante a execução de faixas informativas a colocar nas obras a realizar, constituindo-se assim como fator mobilizador de outras intervenções.
Quanto aos aspetos específicos do programa, considerando a complexidade inerente à compreensão dos aspetos ligados às subvenções, financiamentos, benefícios fiscais e procedimentais, foi feita uma abordagem personalizada, analisando caso a caso, e explicando a cada interessado as vantagens do programa. Neste caso, a abordagem foi feita em entrevista com cada proprietário e explicado no seu caso concreto os benefícios a que poderá recorrer e, sempre que possível, o estudo das vantagens financeiras de que pode usufruir.
Processo
O processo de instrução das candidaturas foi simplificado ao máximo resultando na generalidade dos casos no preenchimento dos respetivos requerimentos no próprio serviço sem mais demoras.
De forma a simplificar os procedimentos e clarificar os aspetos que se constituem como obrigações dos proprietários, foi elaborado um estudo de recomposição, alinhamento e cérceas que foi, à priori, apresentado aos proprietários, constituindo-se esse estudo como elemento suficiente para se iniciar a respetiva obra de conservação ou beneficiação sem a necessidade de mais formalismos.
Para os casos em que a natureza da obra exigiu a apresentação de processo de construção, foi- se aprofundando e coordenando com o Departamento de Administração Urbanística a metodologia de procedimentos que acelera estes processos, quer através do seu tratamento prioritário, quer pelo acompanhamento interno do seu encaminhamento administrativo.
Um dos fatores que se apresentou como a maior dificuldade na instrução das candidaturas às obras de reabilitação foi a elaboração correta das medições e orçamentos. É a partir destes dados que se faz o cálculo das comparticipações e dos valores praticados para a atualização dos arrendamentos após a conclusão das obras. De forma a obviar esta dificuldade, foi fornecida a cada candidato uma base de dados com os descritivos dos trabalhos e dos preços unitários de mercado que estavam a ser praticados nas diferentes obras, com o objetivo de tabelar valores e tipificar os trabalhos. Esta base de dados serviu de referência para todas as intervenções, ao mesmo tempo que funcionou como um importante auxiliar para a instrução das candidaturas às obras.
Na ARU de Cacilhas foram estabelecidas as metodologias de abordagem ao programa que passamos a descrever:
- Contacto direto com todos os proprietários dando a conhecer a existência do programa.
- Entrevista personalizada com todos os proprietários disponíveis analisando caso a caso a adaptabilidade do programa a uma eventual candidatura, bem como procurando no concreto avaliar do ponto de vista económico a eventual operação de reabilitação.
- Elaboração de estudo de recomposição, alinhamento e cérceas dos edifícios de forma a esclarecer à partida quais as obras pertinentes em cada intervenção.
- Elaboração de vistorias prévias.
- Elaboração de mapa descritivo dos trabalhos com os respetivos preços unitários médios, facilitando assim a elaboração das medições e orçamentos de cada candidatura.
- Acompanhamento personalizado de cada processo com minutas tipificadas, geralmente preenchidas no ato da entrevista auxiliando e aligeirando ao máximo a instrução dos processos.
- Desburocratização do processo diminuindo tempos de demora desnecessários.
- Constituição nos serviços de prioridade máxima para processos de candidatura em áreas de ARU quer se constituam como comunicações prévias ou exijam licenciamento municipal.
- Estabelecimento de uma relação privilegiada e expedita entre os diversos serviços municipais intervenientes no processo.
- Informação e divulgação regular sobre o programa no boletim municipal e na página eletrónica do município.
- Acompanhamento técnico periódico das obras em curso.
No município de Almada a entidade gestora das ARU é a Câmara Municipal de Almada, designadamente a Divisão de Qualificação Urbana. Esta decisão de partida consubstanciou-se no facto de se considerar fundamental e imprescindível uma forte relação do município com todos os interessados, assim como na necessidade de assegurar uma maior eficácia em todos os procedimentos internos.
As ARU em Almada para além dos apoios decorrentes dos benefícios fiscais aplicáveis pelo Estatuto do Benefícios Fiscais, comportam outros benefícios financeiros e isenções que permitem discriminar positivamente estas áreas do território relativamente a outras.
OBRA DA RUA CÂNDIDO DOS REIS
A obra de pedonalização da Rua Cândido dos Reis teve início com a sua adjudicação a 5 de abril de 2011 pelo valor de 423.338,07€ e um prazo previsível de oito meses.
A referida obra envolveu não só a repavimentação da rua mas também a renovação das infraestruturas de adução de água e drenagem residual e pluvial e ainda a intervenção mais pontual em infraestruturas de redes elétricas e telecomunicações e de gás. As aberturas de frentes de obra, atendendo à especificidade da rua, foram sendo graduais de montante para jusante,
procurando-se assim perturbar ao mínimo o normal funcionamento da rua.
Considerando que existia na cota mais baixa da rua um vestígio arqueológico importante, a Fábrica romana de salga de Cacilhas, Classificada como Imóvel de Interesse Público, foi integrada no âmbito da fiscalização o acompanhamento especializado de um arqueólogo que acompanhou a execução de todos os trabalhos.
Para além da obra de pedonalização propriamente dita houve lugar à adjudicação da montagem de uma réplica do antigo chafariz de Cacilhas, obra em cantaria muito ambicionada pelos residentes da freguesia, e que foi levada cabo por processo autónomo e cujo valor de adjudicação foi de 35.202,60€.
O chafariz que tinha sido destruído, ao que se supõe, nos finais dos anos 40 do séc. XX, foi reproduzido a partir de fotografias e gravuras existentes e montado sensivelmente no seu local de origem. A obra tal como o se verificava no chafariz original foi realizada em cantaria maciça de pedra de calcário.
Durante o decurso da obra foi detetada a existência de um antigo poço com parede em pedra aparelhada, no antigo Largo do Poço, topónimo que tinha sido dado devido à existência dessa infraestrutura. Do referido poço apenas havia a memória, não existindo até àquela data indícios da sua existência.
Existiam no entanto gravuras que davam nota da existência de um poço que abasteceria de água a população com o auxílio de uma nora. Nos trabalhos de escavação foi encontrada uma laje de grandes dimensões que, ao ser removida deixou a descoberto um poço com paredes em alvenaria ainda com o suporte em ferro da antiga nora. Foi então decidido deixar visível esta infraestrutura tendo-se para tal elaborado um projeto de reabilitação e adjudicada a respetiva obra pelo valor de 17.990,32€.
O poço de Cacilhas pode ser visitado no atual Largo do Bombeiros Voluntários ao cimo da Rua Cândido dos Reis.
OBRA - VICISSITUDES E PROCESSO
Desde o início dos trabalhos os serviços municipais começaram a debater-se com uma série de dificuldades resultantes do fraco rendimento nas frentes de trabalho, dificuldades de implementação das medidas de segurança previamente planeadas, atrasos relativamente ao programa de trabalhos contratado e conflitos permanentes com a direção de obra.
As advertências verbais e escritas dificilmente eram respeitadas quando não mesmo ignoradas. Começaram a tornar-se evidentes as faltas de materiais em obra e sinais claros da falta de pagamentos aos trabalhadores e sub-empreiteiros.
Face a estas evidências, foi solicitada a apresentação de um plano de recuperação ao adjudicatário tendo sido promovida uma reunião entre a administração do adjudicatário e a administração da Câmara, tendo entretanto a empresa reconhecido a sua incapacidade para concluir o trabalho, chegando-se a um acordo revogatório do contrato a 25 de janeiro de 2012.
Perante a situação criada foi necessário a Câmara decidir avançar para uma segunda adjudicação, a outra empresa para a conclusão dos trabalhos, a 5 de março de 2012.
Uma obra por concluir, numa rua com as características já referidas, onde decorriam simultaneamente outras obras de natureza privada resultantes de candidaturas à ARU de Cacilhas, exigiu dos serviços e administração municipais uma capacidade de gestão da situação particularmente cuidada e assertiva.
Uma obra cuja expetativa de conclusão era dezembro de 2011 ter-se-ia de prolongar por um prazo difícil de estimar com óbvio prejuízo para todos.
Valeu de forma determinante todo o planeamento e preparação previamente delineado. A estratégia de informação e contacto constante com todos os interessados e a relação de confiança que se foi estabelecendo entre Câmara, comerciantes e residentes.
Reforçou-se a componente do diálogo permanente, reforçaram-se as assembleias plenárias com moradores, comerciantes e interessados. Manteve-se agora mais que nunca a ligação direta com todos.
Apesar de todas as dificuldades a compreensão e tolerância prevaleceram. O município não era o problema, estava envolvido nele tal como qualquer morador ou comerciante e era uma presença constante para que conjuntamente se fossem encontrando as melhores soluções.
No sentido de minimizar prejuízos foi possível instalar um tapete provisório em toda a extensão da rua para que durante o inevitável período de paragem dos trabalhos se pudesse circular com um mínimo de conforto e segurança.
A segunda fase da obra decorreu sem incidentes, o adjudicatário cumpriu os planos de prazos de execução e finalmente a 13 de julho de 2012 foi inaugurada a obra de requalificação da Rua Cândido dos Reis.
Apesar das vicissitudes deste processo, na rua assistia-se a um grande número de intervenções no edificado privado por via da ARU de Cacilhas.
A ARU DE CACILHAS
A Área de Reabilitação Urbana de Cacilhas tem-se revelado uma experiência extremamente gratificante, quer no que diz respeito aos resultados obtidos, quer na forma como tem funcionado a interação e corresponsabilidade entre o município e os munícipes.
Com as abordagens personalizadas, analisando o caso a caso, levadas a efeito pelos serviços, tem sido possível que, em evidente contraciclo, se obtenham resultados muito significativos, reconhecidos por diferentes entidades bem como por outros municípios onde se aprovaram situações congéneres.
Tem sido particularmente gratificante o número de solicitações de outros municípios para conhecer a nossa experiência, referenciando-a como um exemplo a seguir, quer na metodologia quer no tratamento dos processos.
Na abordagem da temática da reabilitação, na atual conjuntura social e económica, torna-se necessário inovar, criando novos paradigmas de relacionamento entre as entidades públicas e os privados. Tem sido esse o maior reconhecimento que quem nos visita releva.
Os resultados obtidos assentam fundamentalmente na perspetiva de encarar o potencial investidor na reabilitação como um parceiro, assumindo o município fundamentalmente um papel de facilitador e conselheiro, com o propósito último de concretizar as operações.
O investimento em obra pública que se realizou na área de intervenção, assim como a sua localização geográfica, são também fatores decisivos na atração de investimentos externos, havendo aí a preocupação do município de assegurar a manutenção dos residentes, património imaterial fundamental de qualquer área histórica.
O número de candidaturas aprovadas e em curso e a capacidade de atração de investimento externo que se tem verificado, fazem prever que a operação de reabilitação tal como prevista no Documento Estratégico da ARU de Cacilhas possa estar concluída bem antes do seu prazo máximo de vigência que é de dez anos, prorrogáveis por mais cinco.
Com três anos de exercício, e no que diz exclusivamente respeito à reabilitação do edificado, poder-se-á dizer que a esmagadora maioria dos edifícios apresenta um estado de conservação regular ou mesmo bom, alvo das inúmeras intervenções que se têm registado e das que se encontram em curso.
Dos setenta e seis edifícios estimados constata-se que cinquenta e nove já apresentam um estado de conservação regular ou bom.
AÇÕES COMPLEMENTARES E DINÂMICAS CRIADAS
O município atento às vicissitudes do processo e à necessidade de criar dinâmicas de regeneração sedimentadas e sustentáveis no tempo, optou por complementar as intervenções de natureza física com outras de natureza cultural e recreativa, procurando restabelecer e criar novas dinâmicas que conferissem ao local um forte sentido identitário e polarizador.
O programa de atividades que teve o seu início desde o dia da inauguração da obra de pedonalização e se prolongou por três meses, teve como objetivo conferir visibilidade à rua e à intervenção, reforçar a função socializadora, recreativa e turística do espaço público e valorizar as atividades comerciais, em particular a restauração e similares.
Para tal foi elaborada uma imagem de marca com a designação do programa. A imagem gráfica foi utilizada em todos os suportes e materiais e a edição dos folhetos com a programação mensal.
As dinâmicas criadas quer pela pedonalização da rua quer pela reabilitação de edifícios que durante todo este processo foram tendo um incremento significativo, aliadas ao programa de animação cultural e recreativa, foram pondo a área de intervenção na ordem do dia.
Rapidamente se tornou evidente que na área de intervenção não só se verificava o ressurgimento das atividades económicas instaladas mas que também era significativa a capacidade de atração de investidores externos quer no surgimento dum novo tipo de comércio qualificado e especializado quer em novos investimentos na reabilitação do edificado.
A componente turística incipiente até ao início da intervenção sofreu um incremento significativo, sobretudo pela criação de unidades de alojamento local, cujo sucesso é hoje inquestionável.
Recentemente no programa "Espaços & Casas" da SIC foi transmitida uma reportagem sobre um estudo da "Confidencial Imobiliário", acerca do mercado da reabilitação na margem sul, concluindo que os investimentos na reabilitação para arrendamento nesta área atingiam taxas de rentabilidade brutas de cerca de 10%, tornando-os mais atrativos do que nas zonas centrais de Lisboa, Oeiras ou Cascais.
Torna-se por demais evidente que o surgimento das ARU em Almada, em particular da ARU de Cacilhas, são um contributo significativo para os resultados do estudo referido, sendo que as taxas de rendibilidade acima referidas só são possíveis com a aplicação do programa deincentivos vigente que contribui cumulativamente, de forma decisiva, para um ajustamento correto a valores de mercado.
Concluída que foi a obra de reabilitação da rua Cândido dos Reis, tornou-se evidente a criação de dinâmicas socioeconómicas e culturais importantes que funcionam como fatores de motivação decisivos para a iniciativa privada na reabilitação do edificado.
É por demais evidente o atual sucesso do comércio local, num primeiro momento ligado à restauração e bebidas e posteriormente com o surgimento de outro tipo de estabelecimentos e atividades impulsionados pela crescente atratividade da área.
O crescente interesse na criação de atividades ligadas à hotelaria, designadamente no âmbito do alojamento local, sustenta-se na dinâmica entretanto criada que, aliada à situação geográfica da área de intervenção torna o investimento neste tipo de atividade particularmente atrativo.
A manutenção do atual enquadramento fiscal, sustentado no Estatuto dos Benefício Fiscais, anualmente confirmado na Lei do Orçamento de Estado, é fundamental para a prossecução e implementação do programa. Qualquer alteração no sentido de reduzir ou anular os benefícios fiscais em vigor revelar-se-á como uma condenação do programa e porá em causa todo o esforço realizado.
A impossibilidade de recurso ao crédito imobiliário a juros suportáveis continua a ser um obstáculo decisivo para o prosseguimento de muitas obras de reabilitação.
Por outro lado a conjuntura económica que gera fatores de incerteza no futuro é, sem sombra de dúvida, um dos aspetos determinantes para que muitos dos proprietários não avancem com os respetivos processos de reabilitação.
A requalificação do espaço público, a centralidade da zona, a crescente incidência de investimentos na reabilitação em detrimento da expansão urbana e a eventual alteração, a prazo, da conjuntura económica do país poderão ser fatores decisivos para a criação de maiores dinâmicas.
Relativamente à ARU de Cacilhas haverá a natural tendência para um significativo decréscimo de investimento em reabilitação justificando-se tal facto pelas inúmeras intervenções já realizadas e por já restarem poucos imóveis a necessitar de intervenção.
RESULTADOS
Abordar uma área de reabilitação nos pressupostos da Lei consubstanciada no Documento Estratégico que a informa, constituiu-se desde logo num desafio determinante para os resultados desta operação.
Entendeu-se face às experiências de reabilitação de edifícios, acumuladas quer através da reabilitação sistemática de Almada Velha quer pelos processos RECRIA e RECRIPH, que necessitaríamos de uma atitude proactiva por parte do município que conduzisse ao maior conhecimento possível das potencialidades do programa por parte de todos os interessados.
À data da publicação da ARU de Cacilhas, com os programas anteriores (RECRIA e RECRIPH), desde há cerca de nove anos que não se conseguia materializar qualquer obra de reabilitação na zona, justificando-se tal facto pela impossibilidade da maioria dos edifícios reunir as condições necessárias para aderir a estes programas a que se soma a pouca atratividade dos mesmos.
A paralisação generalizada do mercado da construção civil em áreas de expansão potencia o redireccionamento desse mercado para a reabilitação urbana.
É especialmente relevante que o tipo de investimentos que a ARU propicia, leva a que os proprietários encarem a reabilitação de uma forma mais abrangente encarando as obras a realizar de uma forma mais profunda saneando os edifícios globalmente e, consequentemente, melhorando significativamente as condições do edificado, contrariamente ao que muitas vezes se verificava nos programas anteriores onde na maioria dos casos se acudiam fundamentalmente às questões essenciais.
Por sua vez, as Áreas de Reabilitação Urbana potenciam-se num conjunto de benefícios de natureza fiscal que, em Almada, se colecionam com incentivos de natureza financeira e procedimental de iniciativa municipal e que, comparativamente a outras áreas do Concelho, se constituem como fatores concorrenciais bastante favoráveis ao investimento dos particulares.
Em três anos de vigência da ARU de Cacilhas, dois anos e meio das ARU de Almada e Trafaria e seis meses das ARU do Pragal, Monte de Caparica e Cova da Piedade, já foi acumulada a experiência necessária para se poder fazer um ponto de situação representativo das operações, comparando-as com os programas anteriores (RECRIA e RECRIPH) que vigoraram por cerca de vinte e dois anos para todos os núcleos históricos do Concelho numa conjuntura económica muito mais favorável.
Obras RECRIA e RECRIPH
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Obras nas ARU
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Nos quadros comparativos dos dois programas podemos destacar as seguintes conclusões:
- Embora a conjuntura económica do país nos anos de vigência das ARU tenha sido particularmente adversa, quando comparada com o período 1988 a 2010, o montante de captação de investimentos em reabilitação foi já largamente ultrapassado.
- O esforço de investimento público direto a fundo perdido nos programas anteriores que se cifrou em 43%, embora substancialmente superiores aos atuais 5,61%, não se constituiu como fator suficiente nem determinante para assegurar uma significativa adesão dos proprietários à causa da reabilitação.
- Ainda relativamente às subvenções financeiras diretas a fundo perdido, nos programas anteriores, por cada euro pago pelo estado o privado investia em reabilitação 2,33€. Em contrapartida nas ARU em Almada o fator multiplicador situa-se atualmente nos 17,81€.
- Contribuem decisivamente para estes resultados fatores externos e internos, a saber: Fatores internos - Atitude proactiva dos serviços na procura personalizada de potenciais interessados; isenção de taxas e licenças municipais; desburocratização dos processos; celeridade na resposta; encarar os requerentes como parceiros do processo e não meramente como os motores do mesmo; acompanhamento técnico ativo e sistemático na procura das melhores soluções e a atribuição de apoio financeiro a fundo perdido que situa o município na plataforma de parceiro interessado e não como mera entidade fiscalizadora e sancionadora do processo.
- Fatores externos - Programa de incentivos fiscais constantes no Estatuto dos Benefícios Fiscais; legislação recentemente publicada que permite uma maior desburocratização e consequente maior celeridade no processo e necessariamente a quase falência do mercado de construção em áreas de expansão.
Se analisarmos a ARU de Cacilhas, com um universo de 76 edifícios estimados, foram contatados 97% dos proprietários interessando-os pelo programa de reabilitação, tendo-se atingido nestes três anos de vigência um montante de investimento privado de 1.650.906,07 €, intervencionando-se 83 frações das quais 26 se encontravam devolutas e que atualmente se encontram maioritariamente no mercado de arrendamento ou no de turismo.
Para além dos resultados acima expostos é ainda de salientar que, face às dinâmicas criadas, se verificou que alguns proprietários executaram obras de reabilitação por iniciativa própria prescindindo da candidatura à ARU.
A REABILITAÇÃO E REGENERAÇÃO URBANA SÃO UM PROCESSO
Apesar das vicissitudes do processo e o facto de se ter chegado aos resultados que descrevemos, a reabilitação e regeneração urbana são um processo contínuo e o território necessita de uma atenção permanente.
Hoje é frequente vermos na comunicação social diversos artigos elogiosos sobre os resultados obtidos. Nas revistas e jornais e televisão, tratando de temáticas distintas, é frequente descrever-se a Cacilhas como uma área de referência, quer para o investimento quer nas componentes lúdico-turísticas.
Naturalmente que o município permanece atento, o território continua sob permanente observação, continua-se a manter o necessário diálogo com todos os intervenientes: moradores, comerciantes e investidores.
Hoje a Rua Cândido dos Reis é mais que nunca um território sobre pressão que enquanto for positiva contribuirá para um desenvolvimento sustentado e satisfatório para todos os que lá moram, trabalham e visitam.
Atualmente a atenção do município centra-se na procura insistente em continuar a motivar os proprietários ou investidores externos a investir na reabilitação dos imóveis, ao mesmo tempo que procurará monitorizar e ter uma particular atenção ao sucesso da intervenção.
É um trabalho continuado e persistente para o qual é necessária uma especial atenção e para o qual é necessário estabelecer estratégias claras, objetivas e consensualizadas, num constante diálogo com todos os interessados.
Analisando retrospetivamente todo este processo, facilmente se depreende que só com um grande esforço de diálogo permanente com todos os intervenientes envolvendo sempre os eleitos e os técnicos municipais das diferentes áreas do conhecimento, será possível atingir os resultados desejados.
Amélia Pardal
Vereadora da Câmara Municipal de Almada
António Janeiro
Chefe da Divisão de Qualificação Urbana da Câmara Municipal de Almada