Da exclusão à Integração

A urbanização municipal Terraços da Ponte (nome oficial) foi criada para alojar os moradores da Quinta do Mocho em Sacavém, que residiam em quatro torres há décadas inacabadas. Esta urbanização - que entre os moradores continua a ser conhecida por Quinta do Mocho - teve um início auspicioso que rapidamente se esfumou, fruto de mais de uma década de ausência de investimento e, até, da mais elementar atenção por parte do município de Loures.


Território associado à delinquência e criminalidade, a Quinta do Mocho foi sendo alvo de um estigma crescente que ajudou ainda mais ao isolamento desta comunidade de origem maioritariamente imigrante. Ciente desta situação, decidiu o município de Loures organizar em 2014, o Festival o Bairro i o mundo, em parceria com a Associação Teatro Ibisco, visando uma intervenção junto da comunidade, com o objetivo de alterar mentalidades e preconceitos, em suma, de terminar com o estigma.


No processo prévio de realização do festival realizaram-se reuniões comunitárias, dentro do bairro, em espaço público, destinadas a auscultar a população sobre os objetivos e resultados esperados. Perante uma plateia de centena e meia de moradores decidiram-se propostas, discutiram-se ideias, idealizou-se o programa do festival e distribuíram-se tarefas.


Realizado em 2, 3 e 4 de Outubro de 2014, o Festival o Bairro i o Mundo levou até à Quinta do Mocho, o teatro, a música – desde o cante alentejano, ao hip-hop, passando pelas orquestras ligeiras, o reggae, entre muitos outros géneros musicais – a dança e a arte urbana.
Utilizado como fator de aproximação entre a população e o município, o festival foi o catalisador que permitiu ultrapassar afastamento do município relativamente à comunidade, através do envolvimento da população na sua preparação e concretização.


O envolvimento das associações locais e dos munícipes na preparação e realização do mesmo permitiu criar alicerces sobre os quais se edificou uma estrutura de confiança assente num conjunto de compromissos mútuos que têm vindo a dar lugar a novos compromissos, após a concretização dos anteriores. O último objetivo alcançado permitiu que pela primeira vez uma carreira de autocarro passe pela Quinta do Mocho. Pretensão antiga da população foi concretizada graças ao envolvimento do município, da população e da empresa Rodoviária de Lisboa que também ela ultrapassou o seu estigma sobre o bairro.


Perante o sucesso alcançado pela componente de arte urbana e considerando a possibilidade de prolongar no tempo a intervenção municipal, reforçando os laços com a comunidade, decidiu-se criar a Galeria de Arte Pública do Mocho (GAP), que conta hoje com mais de 30 trabalhos de grande dimensão espalhados pelas paredes do Bairro. Nomes como VHILS, Bordalo II, Noman, Mar, MTO, Zabou ou RAM, entre outros, fazem da GAP do Mocho uma das melhores galerias de arte pública da Europa, sendo neste momento mais de três dezenas os artistas que solicitaram a sua participação neste projeto, muitos deles vindos do estrangeiro.


Neste momento a Quinta do Mocho recebe diariamente turistas que percorrem o bairro por sua iniciativa e organiza, no último sábado de cada mês, visitas guiadas que são realizadas pelos próprios moradores, num processo de capacitação e criação de alternativas de sustento num bairro fortemente atingido pelo flagelo do desemprego.


Não obstante toda esta intervenção de elevada qualidade artística, este é um projeto de integração social, de capacitação da população e de criação de condições de vida digna para os mais de 2.500 moradores da Quinta do Mocho. Assim, iniciaram-se também as obras de recuperação do edificado, obras essas que devolvem as condições de habitabilidade perdidas ao longo dos anos.


Por fim, importa realçar que todo este trabalho também permitiu aumentar o número de famílias cumpridoras do pagamento das rendas, demonstrando que uma ligação entre município e residentes resulta numa maior concretização das obrigações de parte a parte.
E enquanto não se conclui a total reabilitação do edificado podemos deliciarmo-nos com os magníficos trabalhos artísticos presentes na Quinta do Mocho, a que acrescem dois ou três novos trabalhos todos os meses.

Rui Monteiro
Gabinete do Presidente da Câmara Municipal de Loures

Algumas imagens do projecto Galeria de Arte Pública do Mocho

 

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